Autoria de Isabel Medina
O teatro, esse lugar onde se vê, constituiu-se desde sempre como um polo sagrado de revelação da nossa essência. Podemos analisar e compreender o ser humano através dos diferentes períodos e eras da humanidade nos espectáculos e textos que se foram produzindo. A história é manipulada e reinventada de acordo com o poder instituído. O teatro acontece no aqui e agora, pessoas com pessoas, não pode ser controlado. Apenas reinterpretado. O teatro é livre.
Neste momento de viragem na história da humanidade, num mundo em constante e veloz mudança, o teatro, esse espelho de confronto de nós connosco, esse ritual único de encontro, sem espaço nem tempo, busca formas de entender quem somos, a partir de dentro, da simplicidade, da verdade, da conexão com a natureza e com o outro. Um teatro feito não só de carne e osso, como da energia pura que nos interliga.
Num tempo de demagogos e ditadores, de divisões e fragmentações, de manipulação e mentira, o teatro está mais que nunca vivo, vibrante, autêntico.
Em Portugal assiste-se a um intenso fervilhar de criadores, de novas estruturas artísticas, de afluência de públicos, de vitalidade e movimento. Face a sucessivos governos que por ignorância, desrespeito, ou apenas medo, insistem em não apoiar o teatro, os seus fazedores, com poucos meios, sem direito a uma vida planeada e estruturada, sempre em situação de precariedade, continuam a construir pontes, a abrir caminhos, a marcar encontro com o outro, a oferecer-se como reflectores e expansores da condição humana, num diálogo incessante e multiplicador.
É com amor que se vive e faz o teatro. Amor pela arte. Amor por nós, seres em permanente conflicto. Amor pelo mundo, pelos oprimidos, diferenciados, esquecidos. Amor pelas infinitas capacidades que possuímos. Amor pelo passado, presente e futuro. Amor que resiste a todas as adversidades. E quando o amor e a confiança comandam, nenhuma força nos pode parar.
E porque o teatro é a mais colectiva das obras, à minha voz acrescento a voz de outros criadores que aceitaram o meu convite para se juntarem a esta mensagem:
Beatriz Batarda: O palco é o lugar da disciplina mais rigorosa onde nada me é proibido. Aí trabalha-se 8,12,14 horas seguidas, as necessárias para que a história possa transportar o espectador na nuvem invisível que leva ao outro lado do tempo.
Carlos J. Pessoa: Quando se diz que o lugar de cada um no Teatro acrescenta espaço para quem vem, estamos a falar de um convite e da assunção de uma responsabilidade. Quem vem, sendo bem-vindo (!), é sempre o outro, meu colega, cúmplice ou desconhecido; quem vem para o Teatro, fazedor de Teatro ou espectador, traz consigo uma parcela do Mundo que acrescenta informação e sensibilidade. É por isso que olhar o outro, venerar o outro, constitui um formidável desafio à imaginação e à inteligência; o outro, no Teatro, abre a porta do efémero e do infinito em igual medida. Que neste dia mundial do Teatro celebremos no Teatro dos outros o Teatro de cada um.
Fernanda Lapa: Há quem chame resiliente à gente de Teatro. Eu digo: nós continuamos a resistir porque o Teatro há mais de 2.500 anos que resiste – a perseguições, à censura política, à censura económica, à guerra, ao fanatismo, às modas, à ignorância!
Isabel Abreu: Repetir falhar repetir falhar repetir. E continuar a ter uma vontade imensa de continuar a repetir e a falhar. Esta ideia de repetição que me persegue. O enorme prazer de escutar. O enorme prazer do aqui e agora, o momento que será sempre e para sempre só aquele momento simples o presente.
Jorge Silva Melo: O Teatro? É tão bom vivermos juntos, espectador! Amantes, sem sermos casados! E todas as noites livres! Tão bom o teatro.
Ricardo Neves-Neves: O Teatro tem arriscado perder a sua efemeridade para dar lugar a uma existência provisória e incompleta. Ainda assim, continua a ser o lugar do jogo, da contracena, da brincadeira, do direito ao ridículo.
Tiago Rodrigues: Numa sociedade cada vez mais consumista e individualista, a assembleia humana do teatro, reunida em torno do mistério artístico, talvez seja o que mais precisamos de colocar no centro das nossas vidas.
Hoje e sempre: Viva o Teatro!
27 de Março de 2018