P&R: O Processo CISAC (Paris/Berlim/Bruxelas, 11 de Abril de 2013) (Comunicado, 04/2013)
1. SOBRE A CISAC
O que é a CISAC?
A CISAC é a Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores e é a principal rede de sociedades de autores do mundo. Com sede em Paris e delegações em Budapeste, Ouagadougou, Santiago do Chile e Singapura, a CISAC é uma organização não governamental sem fins lucrativos cujo objectivo é aumentar o reconhecimento e a protecção dos direitos dos criadores de todas as formas artísticas, promovendo ao mesmo tempo um licenciamento justo e simples por forma a permitir que empresas e particulares gozem e beneficiem de uma comunidade criativa forte e diversificada.
Quem é que a CISAC representa?
Entre os membros da CISAC encontram-se 231 sociedades de gestão colectiva de 121 países, entre as quais a Sociedade Portuguesa de Autores. Através dos seus membros, a CISAC é a voz de mais de 3 milhões de criadores e titulares de direitos em todo o mundo.
Porque é que o seu trabalho é importante?
A grande maioria dos criadores representados pelas sociedades membros da CISAC são pequenos criadores e editores, autores e compositores, cuja subsistência depende de uma remuneração justa pela utilização das suas obras criativas. Os membros da CISAC promovem e protegem os direitos destes criadores, assegurando que todas as remunerações que são devidas pela exibição e execução das respectivas obras chegam às suas mãos. Ao fazê-lo, os membros da CISAC apoiam as actividades culturais e a diversidade de expressões culturais.
Para as empresas que utilizam obras criativas e para o público seu consumidor, a CISAC e os seus membros facilitam um acesso transfronteiriço simples a obras conhecidas e a artistas novos ao promover soluções de licenciamento sustentáveis.
2. SOBRE O PROCESSO
O que é o “Processo CISAC”?
O chamado “Processo CISAC” é um processo do âmbito do Direito da Concorrência, iniciado pela Comissão Europeia contra um grupo de sociedades de autores europeias, entre as quais a Sociedade Portuguesa de Autores. Diz respeito a determinadas disposições constantes dos contratos de representação recíproca celebrados entre estas sociedades, que a Comissão Europeia, numa decisão de 2008, considerou como sendo restritivas da concorrência e impeditivas do licenciamento transfronteiriço do repertório musical na Europa.
Porquê esta designação?
Apesar da decisão da Comissão não ter por destinatária a CISAC, o processo é referido como “Processo CISAC” porque as disposições contestadas pela Comissão Europeia se baseavam num Contrato-Tipo de Representação Recíproca desenvolvido pela CISAC há muitos anos atrás.
Como começou o processo?
O processo começou com duas queixas apresentadas à Comissão Europeia em 2000 e 2003. Na primeira queixa, o grupo alemão de radiodifusão RTL contestou a recusa da GEMA (sociedade alemã) em conceder-lhe uma licença para utilização do seu repertório em toda a Europa. Alguns anos mais tarde, o fornecedor de música de fundo Music Choice apresentou outra queixa alegando que o Contrato-Tipo CISAC continha disposições que, quando transpostas para os contratos de representação celebrados entre as sociedades europeias membros da CISAC, impediam estas sociedades de concorrer entre si na concessão de licenças multiterritoriais sobre os vários repertórios, para a exploração digital de obras.
Havia algum historial de resistência ao licenciamento transfronteiriço por parte dos membros da CISAC?Antes pelo contrário. A CISAC sempre reconheceu a necessidade de apoiar as empresas que dependem das obras criativas através da promoção de um licenciamento global, justo e simples. Além disso, muito antes destas queixas terem tido lugar, os seus membros já estavam a desenvolver um trabalho profundo tendo em vista o desenvolvimento de modelos de licenciamento multiterritorial. Como exemplos de sucesso nesta área podem apontar-se o chamado Acordo de Sidney, do final dos anos 80 do século passado, que previa um modelo de licenciamento que permitia aos organismos de radiodifusão por satélite a obtenção de uma única licença para todas as transmissões por este meio. Os membros da CISAC também tentaram implementar o chamado Acordo de Santiago, quando o acesso à Internet se disseminou. Este Acordo teria oferecido um mecanismo fácil para a obtenção de licenças transfronteiriças para vários repertórios a partir de um só ponto de contacto, mas foi rejeitado pela Comissão Europeia.
Qual foi a reacção da Comissão Europeia ao processo?
Apesar dos esforços significativos que a CISAC e os seus membros tinham feito para desenvolver modelos viáveis de licenciamento multiterritorial para vários repertórios, a Comissão decidiu dar seguimento às queixas da RTL e da Music Choice.
No dia 31 de Janeiro de 2006, a Comissão emitiu uma Declaração de Objecções contra a CISAC e os seus 24 membros com sede no Espaço Económico Europeu (EEE) alegando haver violações das regras da concorrência da UE. As alegadas violações diziam respeito às disposições sobre a adesão, a exclusividade e a territorialidade incluídas no Contrato-Tipo CISAC e nos contratos de representação celebrados entre as sociedades europeias.
A CISAC e os seus membros europeus opuseram-se a esta Declaração?
Não. Em vez disso, iniciaram-se imediatamente novas tentativas de encontrar uma solução viável que pudesse dar resposta às preocupações da Comissão. Em Março de 2007, a CISAC e 18 das sociedades do EEE ofereceram um conjunto de compromissos destinados a dar resposta a todas as alegações enunciadas na Declaração de Objecções, e dispuseram-se a criar um novo quadro de licenciamento multiterritorial para os direitos de execução musical. A CISAC alterou o seu Contrato-Tipo para eliminar as cláusulas-tipo restritivas do direito de adesão, e as sociedades europeias eliminaram também ou deixaram de aplicar as cláusulas de exclusividade nos seus contratos. O objectivo destas medidas era garantir que os criadores tinham a liberdade de se tornarem membros da sociedade por si escolhida e dar a cada sociedade a liberdade de conceder licenças para o seu próprio repertório, fora do seu território nacional.
Que medidas tomou a Comissão Europeia?
Apesar dos esforços da CISAC e dos seus membros para dar resposta às preocupações da Comissão, no dia 16 de Julho de 2008 a Comissão tornou pública a sua decisão sobre as queixas de 2000 e 2003, pronunciando-se sobre três aspectos:
1. A decisão contestou as restrições à adesão constantes do contrato-tipo – na altura em que a decisão foi publicada, estas já tinham porém sido eliminadas.
2. A decisão contestou o carácter das disposições de exclusividade dos contratos de representação recíproca celebrados entre as sociedades – mas, mais uma vez, este ponto já tinha sido eliminado do contrato.
3. A Comissão também defendeu que as 24 sociedades europeias membros da CISAC tinham violado as regras da concorrência da UE ao concertar o âmbito territorial dos seus contratos de representação recíproca. É importante salientar que a Comissão não entendeu que as sociedades estavam proibidas de limitar o âmbito territorial dos seus mandatos; apenas entendeu que as sociedades tinham de se abster de definir restrições territoriais idênticas numa base multilateral.
Qual foi a questão mais significativa?
A terceira questão foi de longe a mais importante para a CISAC e os seus membros, que continuaram a afirmar nunca ter agido dessa forma para limitar a concorrência. Além disso, esta alegação foi totalmente inaceitável para a CISAC, que sempre se norteou totalmente pela justiça e pela defesa dos direitos dos criadores para o desenvolvimento da cultura e das artes.
Por que razão eram então semelhantes os contratos de representação recíproca das sociedades?
Esta situação existia, simplesmente, porque cada sociedade considerava ser do interesse dos seus membros – os autores – incluir tal cláusula nos seus contratos de representação recíproca. É perfeitamente lógico que uma sociedade estrangeira possa querer obter a ajuda de uma sociedade que desenvolva a sua actividade num território específico, já que tal sociedade tem os conhecimentos e recursos locais necessários. A disponibilização de licenças no mesmo território através de várias entidades concorrentes (i.e., várias sociedades) foi evitada por cada uma das sociedades, pois a diminuição do valor dos direitos daí resultante iria claramente contra os interesses dos autores.
3. SOBRE O RECURSO
Quem recorreu da decisão?
Em Outubro de 2008, as sociedades europeias visadas pela decisão da Comissão recorreram da alegada concertação de restrições territoriais junto do Tribunal Geral da UE. Para demonstrar o seu apoio aos seus membros, e enquanto parte interessada implicada na decisão, a CISAC também interpôs um recurso paralelo ao das sociedades seus membros.
4. SOBRE A DECISÃO
A decisão sobre este recurso foi proferida pelo Tribunal Geral da UE no passado dia 12 de Abril, de acordo com as notas que oportunamente publicámos sobre esta matéria, tendo dado razão aos argumentos apresentados pelas sociedades de autores e pela CISAC e anulando a parte da decisão da Comissão Europeia relativa às “práticas concertadas respeitantes às restrições territoriais” nos contratos de representação recíproca. As restantes partes da Decisão de 2008 diziam respeito às cláusulas de adesão dos membros às sociedades e às cláusulas de exclusividade dos mandatos conferidos reciprocamente entre as sociedades, incluídas no Contrato-Tipo CISAC. Estas partes da Decisão não foram objecto de recurso, na medida em que a CISAC e as sociedades seus membros já tinham dado uma resposta satisfatória a todas as objecções da Comissão, através da alteração do Contrato-Tipo CISAC e dos contratos de representação recíproca que o tomavam como modelo, muito antes de ter sido anunciada a decisão de 2008.
11/04/2013